sexta-feira, 27 de junho de 2014

Vó...

Quando pequena, minha mãe foi trazida de St. Antônio da Patrulha para Porto Alegre. Ela iria trabalhar de doméstica na casa de uma senhora e, assim, ajudaria meus avós com o salário. Essa mulher saía para farrear à noite, deixando pilhas de louça suja e uma casa imunda para uma menina de 11 anos dar conta sozinha. Minha mãe fazia o serviço. Mas chorava a noite inteira. Essa mulher devolveu minha mãe, que foi levada para a casa de uma tia que morava por aqui.
Minha tia-avó Olinda a levaria para casa, de volta para os pais. Mas antes, resolveu ver se uma vizinha não queria essa menina de 11 anos para ajudar nos afazeres domésticos. Dona Catarina era o nome dessa vizinha, que olhou bem para minha mãe e disse: "Tu queres ficar? Mas só poderás ficar se for para estudar." Era o que minha mãe mais queria. Estudar!
Dona Catarina a pegou pela mão e a levou para casa. Seu João, seu esposo, estava sentado na varanda quando viu a mulher vindo com a menina. Eis que ele ouviu as seguintes palavras: "Olha, João! Nossa Cleuza voltou, só que já crescida". Cleuza é o nome da minha mãe. Mas também era o nome de uma filha do casal que morrerá ainda bebê.
Minha mãe começou a estudar e ajudava nas tarefas de casa. Ela não era a empregada, ela era uma filha adotiva e fora criada como tal, com uma irmã e um irmão (fora meus oito tios de sangue, filhos dos meus avós biológicos). Minha mãe nunca perdeu o contato com sua família e sempre ia vê-los. Ela agora tinha duas famílias, tinhas dois casais de pais, dez irmãos e muitos tios e primos, tanto de sangue como de coração.
Eu não conheci meus avós maternos, faleceram antes de eu nascer. Mas conheci meus avós de coração, que sempre me trataram como neto. Nunca existiu "dona Catarina" e "seu João" para mim, mas sim, VÓ Catarina e VÔ João. Eu cresci convivendo com eles e com meus tios e primos biológicos e adotivos. Era tudo uma grande família para mim. Não tive carência de avós.
Hoje, aquela que me chamava de "minha joia" partiu. Parou de sofrer em um leito de hospital. Depois de 94 anos fazendo o bem, ela finalmente descansou. Sua casa era a casa de todos, pois minha mãe não foi a única a ser acolhida por ela. Seu coração crescia cada vez mais, conforme seu corpo ia ficando pequenininho. Escutei muita gente falando que devia muito à vó Catarina, que sem ela essas pessoas não teriam se tornado quem são hoje. Senti que não eram palavras de momento. Havia coração nelas.
Foi feita a vontade de Deus. Agora, eu é que tenho uma joia no Céu.


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